Projeto inédito nas Américas, médicos do Hospital de Base de Rio Preto levam pacientes transplantados de pulmão a subirem o Pico das Agulhas Negras, quinta montanha mais alta do Brasil (2.791 metros de altitude)
Natural que as pessoas pensem que pacientes transplantados de pulmão têm a vida limitada, privadas de realizarem grandes esforços e atividades físicas. Projeto inédito nas Américas, conduzido pelo Serviço de Cirurgia Torácica do Hospital de Base de São José do Rio Preto (SP), comprovou que não é bem assim. Acompanhados de profissionais de saúde do HB de Rio Preto, três pacientes transplantados de pulmão subiram os 2.791 metros de altitude do Pico das Agulhas Negras, o quinto mais alto do Brasil. Foram ao cume e voltaram em 10 horas, acompanhados por seis membros da equipe multiprofissional do HB de Rio Preto.
Os três transplantados, Nivaldo Fernandes de Almeida, 62 anos, Maristela Bitencourt, 49 anos, e Marcelo Lima Soares, 26 anos, venceram o desafio proposto, no dia 14 de julho, e estão muito bem. O projeto foi batizado de “InspirAR”, que embute duplo sentido, segundo o cirurgião torácico idealizador do projeto e da expedição, Dr. Isaac de Faria Soares Rodrigues. “Inspirar não apenas como um movimento de encher o peito de ar, mas principalmente como uma ação para inspirar sonhos e ações para as pessoas a buscarem qualidade de vida, vencer limites e desafios”, destaca o médico do HB de Rio Preto.
Para empreitar a subida, foram necessários três meses de reabilitação e muito trabalho para que os profissionais de saúde conduzissem sem impor qualquer risco aos pacientes. Além do Dr. Isaac Rodrigues, o projeto envolveu o cirurgião torácico Henrique Nietmann, a enfermeira Priscila Buck Ruiz, a biomédica Barbara Ellen Batista Magalhães, o fisioterapeuta Leandro Mendonça e a médica intensivista Karla Veronica Spaca Millani.
Entre abril e junho, Nivaldo, Maristela e Marcelo passaram por uma bateria de exames e uma reabilitação baseada em três pilares: avaliação cardiopulmonar, nutricional e reabilitação muscular.
O planejamento do “Projeto InspirAR” começou ano passado, quando Isaac escalou o Agulhas Negras, situado no Parque Nacional de Itatiaia, na divisa do Estado do Rio de Janeiro com o Minas Gerais, para avaliar logística e infraestrutura hospitalar. Os profissionais do HB Rio Preto participaram de um treinamento para situações adversas e suporte à vida em áreas selvagens, seguindo preceitos da Associação Brasileira de Medicina de Áreas Remotas (ABMAR).
“Pensamos nos mínimos detalhes como, por exemplo, contratar seguro saúde para cada um dos transplantados. A direção do Parque Nacional tinha ciência do projeto para nos dar suporte”, conta o cirurgião do HB de Rio Preto.
O grupo subiu a montanha na companhia de dois guias treinados do Parque Nacional e estavam munidos de um comunicador satélite, cilindros de oxigênio e mochila com equipamentos médicos. “Tudo isso aliado à experiência clínica da equipe, oferecemos um suporte semelhante a um ‘mini-hospital portátil’”, pontua Dr. Isaac.
Na altitude e sob a fadiga da subida, os pacientes e equipe médica passaram por avaliações com coleta de amostras de sangue, testes pulmonares, avaliação da saturação de oxigênio e sinais vitais, controle de sintomas de altitude, testes de esforço monitorizados e ultrassom de tórax.
“Nivaldo, Maristela e Marcelo são campeões. Eles venceram uma fila para doação de órgãos, venceram um transplante de pulmão bilateral, venceram uma doença pulmonar limitante e terminal e venceram este desafio da montanha. Nunca devemos subestimar o coração de um campeão”, declarou Dr. Issac. “Após cansaço, superação, emoção e fé durante a subida do Agulhas Negras o projeto InspirAR cumpriu seu principal objetivo. Inspirou”, finalizou o médico do HB Rio Preto.
Entre abril e junho, Nivaldo, Maristela e Marcelo passaram por uma bateria de exames, e uma reabilitação baseada em três pilares: avaliação cardiopulmonar, nutricional e reabilitação muscular. A avaliação cardiopulmonar, inclusive com ergoespirometria, e programa de exercícios, foi planejada pela médica cardiologista Clarissa Rodrigues Pinet, especialista em reabilitação cardíaca e medicina do esporte. Ela coordenou a realização dos testes cardiopulmonares conduzidos pelo cardiologista Danilo Martin, na unidade do Instituto de Reabilitação Lucy Montoro, situada junto ao Hospital de Base de Rio Preto, em parceria com a cardiologista Adriana Bellini, do IMC – Instituto de Moléstias Cardiovasculares, de Rio Preto. O projeto contou com a participação também da nutricionista Fernanda Tavares.
Várias empresas e instituições colaboraram também como o projeto, como a SupremaMED, Celler, PróLife Diagnósticos, Só Fórmulas, Farmácia Fourlab, Instituto A, Clínica Omne, Instituto do Tórax, Clínica Musolino, OW Café e Gastronomia, A Casa de Aventura, Associação Brasileira de Medicina de Áreas Remotas (ABMAR), Amigos da Montanha, AM Universitários e Casa de Aventura.
Histórias de superação
A consultora de vendas Maristela Bitencourt, 50 anos, passou pelo transplante de pulmão em setembro de 2022. Para ela, participar da expedição foi um ato de coragem e superação. “Ter superado os meus limites foi muito importante. A gente não sabe dos nossos limites e sempre vamos superando. O sentimento é de felicidade e gratidão”.
Além da questão que envolve todo o processo pessoal, participar do Projeto Inspirar também envolve o incentivo à doação de órgãos. “Falando de mim, fui muito inspirada por pessoas que já tinham entrado na fila, passado pelo transplante. Não sou a última, existem muitas pessoas que precisam de coragem, incentivo, é uma fase difícil do pré-transplante. Além de incentivar a doação de órgãos, seguir em frente, que tudo vai dar certo”, afirma Maristela.
Após passar pelo transplante, a história do aposentado Nivaldo Fernandes de Almeida, 62 anos, e Maristela se cruzou. Eles começaram o namoro em julho de 2022 e atualmente estão casados. Eles participaram juntos do Projeto Inspirar.
O projeto do HB de Rio Preto, segundo Nivaldo, intensificou a união entre os dois. “Foi muito bom, os dois juntos, dando força um para o outro. Ao longo do tempo fomos intensificando os nossos treinos, participando de todos os exames, fomos muito bem assistidos”, disse.
Nivaldo foi transplantado em setembro de 2019, no Hospital de Base de Rio Preto. Ações básicas, como higiene básica, era uma dificuldade ser realizada no dia a dia.
“É até difícil de explicar a emoção (de participar do projeto). Lembrar que há cinco anos e meio mal podia levantar da cama para fazer higiene, poder subir 2.790 metros com 62 anos foi uma emoção muito grande. Vou levar para a vida toda”, disse.
O autônomo Marcelo Lima Soares, 26 anos, também participou do projeto Inspirar e destaca a importância e o que mudou. “Foi algo totalmente diferente, onde mais uma vez superamos os limites físicos e psicológicos. Foi excelente, pelo aspecto pessoal, eu que estava um pouco sedentário, foi um incentivo para viver a vida, cuidar da saúde”, finaliza. Marcelo foi transplantado em setembro de 2020.